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Gerenciador de risco não pode repassar informações negativas de motoristas no RS

por | out 5, 2020 | Notícias

Fonte: Brasil no Trecho
Chapéu: Motoristas

Empresas seguradoras e gerenciadoras de riscos têm de se abster de pesquisar, armazenar e repassar informações negativas sobre motoristas de transporte de carga internacional com base em consultas ao SPC, Serasa, Receita Federal, boletins de ocorrência, inquéritos policiais e em processos criminais e cíveis sem sentença transitada em julgado.

A determinação partiu da 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) ao aceitar, em parte, recurso interposto pelo Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários de Cargas de Linhas Internacionais do RS (Sindimercosul) contra sentença que negou uma ação civil pública movida por este contra aquelas empresas.

Para garantir o efetivo cumprimento da ordem judicial, o colegiado fixou em R$ 10 mil a multa diária para cada caso comprovado de violação. Os réus também foram condenados a pagar dano moral coletivo no valor de R$ 1 milhão. O dinheiro será rateado para duas entidades filantrópicas da cidade de Uruguaiana, sede do Sindimercosul: Hospital da Santa Casa de Caridade (R$ 700 mil) e Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais-Apae (R$ 300 mil).

Abuso de direito

Para o relator do recurso, juiz convocado Carlos Henrique Selbach, as empresas de transporte têm autonomia para contratar os empregados que melhor atendam os seus interesses. No entanto, no exercício deste poder diretivo, não podem exceder os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes, como indica o artigo 187 do Código Civil.

O julgador observou que a jurisprudência confirma a conduta abusiva das seguradoras e empresas gerenciadoras de risco com atuação nas relações de transporte de carga. Citou, especialmente, as teses firmadas pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do TRT-4 no julgamento de recurso repetitivo 243000-58.2013.5.013.0023, em acórdão publicado em 22 de setembro de 2017.

Diz a primeira tese: ‘‘Não é legítima e caracteriza lesão moral a exigência de certidão de antecedentes criminais de candidato a emprego quando traduzir tratamento discriminatório ou não se justificar em razão de previsão de lei, da natureza do ofício ou do grau especial de fidúcia exigido''.

A segunda tese é mais esclarecedora: ‘‘A exigência de certidão de antecedentes criminais de candidato a emprego é legítima e não caracteriza lesão moral quando amparada em expressa previsão legal ou justificar-se em razão da natureza do ofício ou do grau especial de fidúcia exigido, a exemplo de empregados domésticos, cuidadores de menores, idosos ou deficientes (em creches, asilos ou intuições afins), motoristas rodoviários de carga, empregados que laboram no setor da agroindústria no manejo de ferramentas de trabalho perfurocortantes, bancários e afins, trabalhadores que atuam com substâncias tóxicas, entorpecentes e armas, trabalhadores que atuam com informações sigilosas''.

Inquéritos criminais

O julgador lembrou que o parágrafo único do artigo 20 do Código de Processo Penal é claro: ‘‘Nos atestados de antecedentes que lhe forem solicitados, a autoridade policial não poderá mencionar quaisquer anotações referentes à instauração de inquérito contra os requerentes''.

‘‘A posição adotada pelo TST no tema repetitivo transcrito filia-se à corrente doutrinária, cujo entendimento é de que a alteração do parágrafo único do artigo 20 do CPP, conferida pela Lei 12.681/2012, proíbe, tão somente, a menção à instauração de inquéritos contra os requerentes, mas não impede a referência a condenações pretéritas, desde que estas condenações já tenham transitado em julgado'', esclareceu Selbach em seu voto.

Vida financeira

Na fundamentação, o relator ainda lembrou que o artigo 198, caput, do Código Tributário Nacional proíbe a divulgação, por parte da Fazenda Pública ou de seus servidores, qualquer informação sobre a situação econômica ou financeira dos sujeitos passivos ou de terceiros e sobre a natureza e o estado dos seus negócios ou atividades. E as empresas demandadas na ACP não se enquadram em quaisquer das exceções prevista em lei que lhes assegurem o acesso a essas informações, tampouco de seu compartilhamento.

‘‘Quanto às informações constantes de cadastros de empresas que se dedicam à restrição ao crédito, embora se tratem de bancos de dados de caráter público (artigo 43, parágrafo 4º, da Lei 8.078/90), e que existem exatamente para serem consultados, quando utilizados, na situação ora em exame nos autos, com objetivo de traçar o perfil do motorista, para fixação do seguro da carga, subsidiando a decisão final da transportadora quanto à contratação do motorista no transporte da carga, consubstancia conduta discriminatória, que ofende a princípios de ordem constitucional e à legalidade da sua atuação'', expressou no voto.

A inscrição do nome de algum motorista inscrito num cadastro de maus pagadores – discorreu no voto – não pode servir como penalidade ao acesso ao trabalho. Afinal, se não forem contratados para prestar trabalho remunerado, terão mais dificuldade de adimplir suas obrigações, gerando um círculo vicioso, extremamente desfavorável.

‘‘O artigo 13-A da Lei 11.442/2007, incluído pela lei dos motoristas profissionais (Lei 13.103/2015), proíbe a utilização de informações de banco de dados de proteção de crédito como mecanismo de vedação de contrato com o transporte autônomo de cargas e com as empresas de transporte de cargas'', complementou.

A decisão da 2ª Turma do TRT-4 foi tomada na sessão virtual do dia 22 de setembro e tem aplicação imediata, com aplicação para os motoristas empregados dentro do estado do RS e na área de abrangência do Sindimercosul. Cabe recurso ao Tribunal Superior do Trabalho.